quinta-feira, 3 de novembro de 2011

Arquivo Confidencial


      Hoje tive uma conversa com minha babá da infância, aquela que me criou, porque meus pais andavam sempre tão ocupados, não tinham tempo pra detalhes da nossa convivência.
      Ela me falava de como fui uma criança estranha, diferente das outras. Não gostava de brincar, porque podia suar, e não gostava de suar, apesar de adorar tomar banho. Mas, gente, que criança gosta de tomar banho? Bem, eu gostava. Gostava também de ouvir conversa de adulto, e cruzava as pernas para parecer fazer parte daquele grupo. Achava deplorável o fato de meus primos correrem, se jogarem no chão, se lambuzar na lama. Será que eles não enxergavam que aquilo poderia acabar com a roupa deles? Deus me livre! Mantinha-me impecável, esperando meus pais chegarem. Queria que meu pai me olhasse e dissesse: "Coisa linda! Uma princesa!" e que minha mãe confirmasse a presença na reunião do colégio. Sei que isso pouco aconteceu, porque quando eles chegavam eu estava dormindo, e quando eu acordava eles já haviam saído. Foram tantos desencontros desse tipo que decidi sair de casa cedo, aos 12 anos já tinha um apartamento meu, numa cidade diferente, convivendo com pessoas diferentes. Minha babá lembra o quanto sofreu com a separação, pois ela sente (e é mesmo) como minha mãe.
      Enfrentei barras pesadas, sentia falta de carinho e atenção, achava minha criação um pouco deficiente, que não conseguiria crescer enquanto não tivesse o que me foi negado na infância. Não. Nada me foi negado, ao contrário, tudo me foi disponibilizado. Reconheço o esforço dos meus pais, sei que batalham até hoje para eu ser uma grande mulher; assim como minha mãe.
      Aliás, minha mãe é meu exemplo. Quem dera um dia eu ser a metade do que ela é. Dá um duro danado, trabalha noite e dia, esposa dedicada, solidária com o próximo, todas qualidades possíveis de um ser humano, ela tem. Encho o peito de orgulho pra falar que sou sua filha, e queria ver um dia ela ter o mesmo orgulho em dizer que é minha mãe.
      Meu pai não... meu pai é um eterno garotão, tem uma vivacidade de dar inveja nesses meninos de 20 e poucos anos. Olho pra ele e me vejo, nos parecemos tanto que costumo dizer a ele: "eu sou sua cara, você é meu coroa."  Carinhoso como só ele sabe ser. Me abraça, me beija, quase me deixa sem respirar, literalmente me entope de amor! Tem uma filosofia de vida que é só dele: não adianta se estressar, nem se apegar a nada material, a vida vale mais que tudo. Vamos semear a simplicidade, vamos semear o bem. Enfim... meu pai é paz e amor.
      Garanto aos meus pais que tudo que sou, devo a eles. Posso não ser muita coisa agora, mas ainda serei. Quero poder proporcionar o prazer de uma boa velhice, o tal do descanso merecido.
      À minha babá agradeço todo amor, carinho, esforço, paciência e puxões de orelha que me foram dados. Agradeço também o fato de ser madrinha de seu único filho, isso pra mim vale mais que mil palavras, é uma prova de confiança. Muito obrigada.
      Olho pra trás e vejo o quanto cresci, mudei. Apesar das minhas crises, do meu porte frágil, da minha sensibilidade física; tenho uma personalidade forte, um gênio impossível. Como dizia minha vó (que Deus a tenha em um bom lugar) "Essa menina, desse tamanho, já tem cabelo na venta! Valente mais que onça!" Sou mesmo valente e às vezes posso parecer um tanto bruta e desbocada, o que tiver pra falar, eu falo na lata. Não espere de mim um comportamento médio, não sou uma pessoa média, não gosto de gente média. Não sou médio bonita, nem médio inteligente, nem médio magra ou gorda. 8 ou 80, ou é, ou não é. Nada aos pedaços, por favor. Ou muito ou pouco, ou tudo ou nada. É o que tem pra hoje. Se não gostou? Devolva, a casa recebe; ao contrário, você vai ter que me engolir. 

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